ATRIBUTOS PESSOAIS DA CULTURA DA HOSPITALIDADE: APLICAÇÃO AOS ESTUDANTES DE ENSINO SUPERIOR EM PORTUGAL

PERSONAL ATTRIBUTES IN THE HOSPITALITY CULTURE: APPLICATION TO UNDERGRADUATE AND GRADUATE STUDENTS IN PORTUGAL

ATRIBUTOS PERSONALES DE LA CULTURA DE LA HOSPITALIDAD: APLICACIÓN A LOS ESTUDIANTES DE GRADO Y POSGRADO EN PORTUGAL

Adriana Lopes Fernandes[1]

Drielle de Santana Fonseca[2]

Lílian Ponzo Ribeiro[3]

Resumo

Esta pesquisa teve como objetivo compreender se a formação oferecida pelas instituições de ensino superior portuguesas, voltadas para a hospitalidade e gestão hoteleira, é capaz de desenvolver nos estudantes os atributos pessoais necessários e desejados aos profissionais da indústria da hotelaria. Relativamente à metodologia, foi realizado um survey com estudantes de gestão hoteleira ou equivalente. O instrumento utilizado na coleta dos dados foi devidamente traduzido e adaptado do inglês para a língua portuguesa e distribuído online por meio da plataforma Limesurvey. A amostra foi composta de 112 estudantes de graduação e mestrado. Os dados foram classificados e analisados utilizando-se o software IBM SPSS Statistics. Os resultados apontam que embora haja preocupação das instituições portuguesas na formação técnica, o escore dos estudantes foi um pouco abaixo do esperado para profissionais dessa indústria. Concluiu-se que as instituições de ensino portuguesas, principalmente ao nível da graduação, precisam criar estratégias capazes de desenvolver nos estudantes atributos necessários ao trabalho nessa indústria, de forma a evitar um problema já nela existente, que é a alta rotatividade.

Palavras-chaves: Hospitalidade, Indústria Hoteleira, Atributos Pessoais, Cultura Organizacional.

 

Abstract

The purpose of this research was to understand whether the training offered by the Portuguese educational institutions focused on hospitality and hotel management isable to develop in students those personal attributes that are necessary and desired in the hotel industry professionals. Regarding the methodology, a survey was conducted with students of hotel managementor equivalent. The instrument used for the data collection was duly translated and adapted from English into Portuguese, and distributed online through the Limesurvey platform. The sample was composed of 112 undergraduate and master's students. The data were classified and analyzed using the IBM SPSS Statistics software. The results indicate that, although there is concern of the Portuguese institutions regarding the technical training, the score of the students was slightly below the expected for professionals in this industry. It was concluded that Portuguese educational institutions, especially at the undergraduate level, need to create strategies capable of getting students to develop the attributes necessary to work in this industry, in order to avoid an already existing problem it has, which is high turnover rates.

Keywords: Hospitality, Hotel Industry, Personal attributes, Organizational Culture

Resumen
Esta investigación tuvo como objetivo comprender si la formación ofrecida por las instituciones educativas portuguesas centradasen la hospitalidad y la la gestión hotelera escapaz de desarrollar en los estudiantes las cualidades personales necesarias y deseadas a los profesionales de la industria de la hospitalidad. En cuanto a la metodología, se realizó un survey con estudiantes de gestión hotelera o equivalente. El instrumento utilizado para recolectar los datos fue debidamente traducido y adaptado desde el inglés al portugués y distribuido online a través de la plataforma Limesurvey. La muestra fue compuesta de 112 estudiantes de licenciatura y maestría. Los datos fueron clasificados y analizados utilizandose el software IBM SPSS Statistics. Los resultados apuntan que aunque exista la preocupación de las instituciones portuguesas acerca de la formación técnica, el score de los estudiantes fue ligeramente inferior a lo esperado para los profesionales de esta industria. Se concluyó que las instituciones educativas portuguesas, especialmente a nivel de grado, necesitan crear estrategias para que los estudiantes desarrollen los atributos necesarios para trabajar en esta industria, con el fin de prevenir un problema ahí ya existente en la industria, cual sea la alta rotación.

Palabras clave: Hospitalidad, Industria hotelera, Atributos Personales, Cultura Organizacional.

 

1. INTRODUÇÃO

O turismo é uma das mais promissoras indústrias mundiais. No que tange à economia portuguesa, esse setor tem demonstrado uma crescente expansão, tendo uma contribuição direta de 6,4% no Produto Interno Bruto (PIB), o que representa 11,3 bilhões de euros em 2016, segundo dados da WTTC (2016). A indústria da hotelaria é um dos principais pilares deste setor no país. Segundo o Atlas da Hotelaria da Deloitte (Deloitte, 2016), de 2012 para 2016 houve um aumento de 84% no número de hotéis em Portugal.

Essa expansão dos empreendimentos hoteleiros vem acompanhada por uma progressiva melhoria na qualidade do serviço prestado, devido ao aumento da competitividade e profissionalização das empresas (Baltieri & Peçanha, 2011). Tal melhoria nos serviços está diretamente relacionada à capacidade dos colaboradores de desenvolver suas funções em um nível de qualidade compatível com as exigências do mercado (Silva, Medeiros, & Costa, 2006; Dawson, Abbott, & Shoemaker, 2011), uma vez que esse comportamento é determinante na satisfação do cliente (Lamonato & Presser, 2015).

Ha, entretanto, uma grande dificuldade por parte das empresas da indústria da hotelaria em contratar e manter profissionais que se adequem ao perfil desejado devido às longas jornadas de trabalho, esgotamento, estresse, oportunidades de desenvolvimento limitadas, baixos salários e sazonalidade (Baltieri, 2011; Dawson et al., 2011; Lamonato & Presser, 2015).

Dawson et al. (2011), em seus estudos, iniciaram uma discussão sobre quais seriam os atributos pessoais necessários para que um indivíduo se adequasse ao ambiente dessa indústria, que segundo os autores, exibe uma cultura organizacional diferenciada e complexa. Tendo como base esse trabalho, o presente estudo teve como objetivo compreender se a formação oferecida pelas instituições de ensino portuguesas voltadas para a hospitalidade e gestão hoteleira é capaz de desenvolver nos estudantes os atributos pessoais necessários e desejados aos profissionais da indústria da hotelaria.

Com este estudo, pretende-se contribuir para análises mais sólidas e consistentes acerca da formação recebida pelos futuros profissionais dessa indústria, alertando as instituições de ensino quanto à necessidade de possuir planos de desenvolvimento que incluam atividades que possibilitem o desenvolvimento dos atributos e valores pessoais necessários para o desenvolvimento de um trabalho adequado na indústria da hospitalidade, principalmente para países em que essa indústria é considerada altamente importante para o desenvolvimento da economia.

Como contribuição secundária, destaca-se a validação da versão traduzida do inglês para a língua portuguesa do instrumento desenvolvido por Dawson et al. (2011) para avaliar se os atributos pessoais de um profissional são compatíveis com as características e valores exigidos em um ambiente que exibe a cultura organizacional da hospitalidade. A tradução desse instrumento pode vir a ser utilizada no processo de avaliação da formação dos estudantes das instituições superiores de países de língua portuguesa e tambémpela área de recursos humanos dos empreendimentos hoteleiros nos processos de recrutamento e seleção.

 

2. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.1. A indústria da hotelaria em Portugal

A indústria da hospitalidade, uma das mais importantes do setor do turismo (Rogerson & Kotze, 2011; Kokt & Ramarumo, 2015), é composta por uma ampla variedade de indústrias de serviços, incluindo a indústria da hotelaria, foco deste estudo (Brotherton & Wood, 2008). A indústria da hotelaria teve, em 2011, uma receita global de 457 bilhões de dólares, e a previsão para 2016  é de 550 bilhões de dólares, um aumento na receita de quase 100 bilhões de dólares em cinco anos (Killarney Hotels, 2015). Em Portugal, ela representa uma parcela significativa do PIB, além de contribuir para a criação de empregos e estimulação da economia (Deng, 2011; Kokt & Ramarumo, 2015).

O relatório internacional da JLL Hotels & Hospitality Group (Pera, 2016) aponta que a indústria da hotelaria portuguesa tem recebido grande atenção de investidores, principalmente por parte dos mercados secundários na região EMEA[4]. Segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) o número de hotéis no país quase duplicou entre 2002 e 2012, com um crescimento de 90%, passando de 520 para 988 unidades (Lusa, 2014). De 2012 para 2016 houve outro salto, segundo o Atlas da Hotelaria da Deloitte (Deloitte, 2016), sendo que em 2016 registrou-se um número de 1.864 empreendimentos turísticos [5] em Portugal, aumento de 84% desde 2011, sendo que destes, 1.580 são hotéis.

A indústria da hotelaria é particularmente diversificada e complexa, principalmente pelo fato de ser um serviço que incorpora práticas de negócios globais em um ambiente multicultural, por atender clientes de diversas partes do mundo (Dawson et al., 2011; Chen et al., 2012). Além disso, ela é considerada bastante peculiar, pelo fato do produto “hospitalidade” não ser um produto físico, uma vez que é a maneira pela qual o colaborador presta o serviço de hospitalidade que se torna fundamental para a satisfação geral do cliente com a "experiência" que está sendo comprada (Dawson & Abbott, 2011).

Tendo em vista a complexidade do ambiente e da cultura organizacional dessa indústria, e a importância do profissional para a satisfação geral do cliente, o próximo tópico terá este enfoque.

 

2.2. A cultura organizacional  e sua relação com os atributos pessoais dos profissionais da indústria da hospitalidade

A cultura organizacional, de forma simples, pode ser definida como um conjunto de valores e pressupostos básicos expressos em elementos simbólicos capazes de comunicar e expressar a visão consensual aos membros da organização (Fleury, 1989). Chen et al. (2012) apontam que ela pode ser um motor na formação das atitudes e comportamentos dos colaboradores, pois desempenha um papel significativo na compreensão dos conceitos de serviço.

Na indústria da hospitalidade, os valores e pressupostos são delineados por um sentimento de bem-estar, de fazer com que o outro, no caso o cliente, sinta-se satisfeito, “em casa”, com o espírito de servir bem o outro, que foi caracterizado como “The Smile Factory” nos estudos de Kemp e Dwyer (2001). Nessa indústria, a cultura organizacional  tem o importante papel de fazer com que os colaboradores saibam quais são os objetivos da organização e dessa forma sejam comprometidos em trabalhar em prol desses objetivos (Kokt & Ramarumo, 2015).

Um bom exemplo de empresa que desenvolve uma adequada cultura organizacional para a indústria da hospitalidade é o Marriott Hotels Group, que mantém sua liderança no mercado, não por meio das tecnologias, mas por meio de seus colaboradores. Esta rede de hoteis  proporciona a chamada "experiência organizacional" aos colaboradores, onde se destaca o prazer de trabalhar em equipe, a criatividade, a inovação e a valorização do colaborador (Kandampully et al., 2016). A cultura organizacional  do Marriott Hotels Group entende os colaboradores como uma fonte vital de hospitalidade e, assim como proposto por Schein (1985), cultivam um ambiente que faça com que os colaboradores se sintam motivados por bons relacionamentos sociais no local de trabalho.

No entanto, nem todos os empreendimentos hoteleiros agem da mesma forma. A indústria da hospitalidade é ainda marcada por baixos salários, baixa segurança no trabalho, longa jornada de trabalho, esgotamento, estresse, oportunidades de desenvolvimento limitadas e sazonalidade (Dawson et al., 2011; Kokt & Ramarumo, 2015). Essas questões levam à alta rotatividade dos colaboradores, ou turnover (Baltieri, 2011; Dawson, 2011) e, consequentemente,  dificuldade de contratar e manter colaboradores que consigam assimilar a cultura organizacional da hospitalidade (Dawson et al., 2011). Oz et al. (2015) afirmam que o tempo de trabalho de um colaborador na empresa é imprescindível para que o mesmo possa assimilar os valores da cultura organizacional nessa indústria e proporcionar a “experiência” desejada pelos clientes.

Na tentativa de reduzir a taxa de turnover e suas consequências na prestação do serviço, torna-se primordial definir o perfil dos profissionais desejados e desenvolver estratégias de gestão de recursos humanos para atrair, reter e garantir condições e relações de trabalho satisfatórias a esses profissionais (Baltieri, 2011; Dawson et al., 2011; Lamonato & Presser, 2015). Atrair e reter profissionais capazes de fornecer um serviço excepcional ao cliente deve ser  prioridade para as empresas dessa indústria, tendo em vista que a relação entre os colaboradores e o cliente tem uma grande influência na satisfação e lealdade deste último (Deery, 1997; Baltieri, 2011; Dawson et al., 2011).

Estudos foram realizados para identificar os atributos comuns diretamente relacionados com o sucesso de gestores e colaboradores da hotelaria (Gregory, Harris, Armenakis, & Shook, 2009; Gobara, Rossoni, Kato, Dossa, & Hocayen-da-Silva, 2010; Dawson et al., 2011), sendo eles: gostar de trabalhar na área de serviços e de ajudar pessoas, ser receptivo, amigável e caloroso, ser culturalmente consciente, valorizar a diversidade, ser comunicativo, flexível, tolerante a erros, entre outros (Leite & Rego, 2007; Gregory et al., 2009; Gobara et al., 2010; Dawson et al., 2011).

Um dos estudos mais completos é o de Dawson et al. (2011), que descreve as características e valores de diferentes stakeholders dentro da totalidade da indústria da hospitalidade. Segundo os autores, um profissional dessa indústria deveria apresentar seis atributos principais, quais sejam: princípios, recetividade, liderança, capacidade de assumir riscos, objetividade e postura (Figura 1). Esses atributos são detalhados mais à frente neste trabalho, uma vez que são utilizados para identificar os atributos pessoais dos estudantes portugueses.

 

Figura 1: Atributos pessoais de um profissional da indústria da hospitalidade

 Fonte: Elaborado pelas autoras (2017)

3. METODOLOGIA

Para concretizar o estudo, foi realizado um survey com estudantes de gestão hoteleira em Portugal. O instrumento utilizado na coleta dos dados foi proposto por Dawson et al. (2011), denominado de Hospitality Culture Scale (HCS), que foi construído a partir de estudos com empresas da indústria da hospitalidade, como Marriot e Ritz Carlton, e mediante literatura a respeito dos atributos dos profissionais da hospitalidade.

O instrumento possui duas partes, uma relacionada aos atributos exclusivos das organizações de hospitalidade, ou seja, a cultura organizacional da Hospitalidade, e uma segunda parte que identifica as características e valores de uma pessoa que seria bem-sucedida em um ambiente de trabalho que exibe essa cultura. A proposta dos autores foi criar uma medida quantitativa, para que a área de recursos humanos pudesse utilizar como ferramenta em processos de recrutamento, seleção e treinamento, a fim de adequar o potencial empregado à cultura organizacional  das empresas da indústria da hospitalidade. Neste estudo, recorreu-se somente à parte do instrumento que mede os atributos pessoais dos colaboradores.

O instrumento é constituído por 33 itens distribuídos em seis fatores, sendo:

ü  Princípios (10 itens): fator associado a palavras normalmente usadas para explicar as crenças e valores pessoais de alguém, como: confiança, honestidade, integridade, veracidade, manter promessas (ter palavra), crenças e princípios, lealdade, liderança, e confiabilidade.

ü  Receptividade (11 itens): fator relacionado à forma como uma pessoa trata as outras pessoas, inclui comportamentos como ser amigável e caloroso, ser alegre, saber partilhar, saber servir os outros, ser sociável, ter confiança nos outros, ser focado, positivo e culturalmente consciente.

ü  Liderança (5 itens): fator associado às habilidades pessoais que alguém exibe na gestão dos negócios e dos outros. Essas habilidades incluem ser um treinador ou mentor, um líder natural, ter pensamento estratégico e ter uma boa visão do negócio.

ü  Assunção de riscos (3 itens): fator relacionado aos aspetos de uma pessoa que assume riscos, que possui características como ser um tomador de risco, ser aventureiro e assumir riscos calculados.

ü  Objetividade (2 itens): fator ligado a características como ser detalhista e preciso no desenvolvimento do trabalho.

ü  Postura (2 itens): este fator está relacionado ao comportamento geral de alguém, sendo as principais características para esse ramo ser calmo e possuir baixa ansiedade.

A partir dos 33 itens, divididos nas dimensões apresentadas, foi elaborado um questionário operacionalizado por meio de 33 afirmações, em que se solicita aos inquiridos avaliar o seu grau de concordância numa escala do tipo Likert de sete pontos, variando de (1) “discordo totalmente” a (7) “Concordo totalmente”. As 33 afirmações estão redigidas de forma positiva (por exemplo, "Eu sou muito confiante"). O instrumento cria uma linha de base para indicar se os atributos pessoais e valores individuais de um profissional são adequados para o contexto da indústria da hospitalidade, apontando que uma pessoa com escore médio de 5,82 ou superior é adequada para trabalhar nesse contexto.

Para utilização neste estudo, o instrumento foi traduzido seguindo os procedimentos propostos por Beaton, Bombardier, Guillemin e Ferraz (2000) no intuito de obter uma versão linguisticamente correta e equivalente à versão original. Os itens da escala foram primeiro traduzidos para a língua portuguesa, por três tradutores diferentes oficialmente proficientes em inglês. Em seguida, o conteúdo das traduções foi analisado e comparado por três pesquisadores (dois portugueses e um brasileiro), tendo sido produzida uma única versão de consenso em língua portuguesa que mais se aproximava semanticamente do conteúdo da versão original.

Essa versão sofreu uma retrotradução para a língua original, por um quarto tradutor que não conhecia a escala. A retrotradução foi comparada com a escala original em inglês pelos autores e um profissional especialista em linguística, a fim de verificar se o significado das perguntas foi mantido. Essa análise levou a várias correções relacionadas à equivalência linguística e semântica, por exemplo, “eu sou muito confiável” ficou validado como “eu sou muito confiante”

Após a tradução, procedeu-se a um estudo-piloto, com estudantes de variados cursos do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), com o objetivo de avaliar a linguagem e a forma do conteúdo do instrumento (Maroco, 2014). Os itens da escala sofreram novamente ajustes, por exemplo, “sou firme nas minhas convicções e princípios”, que após a verificação ficou estabelecido como “sou firme nos meus princípios e valores” para que todos os indivíduos fossem capazes de compreender perfeitamente as afirmativas que compõem o instrumento.

Após realizadas as alterações, o questionário foi disponibilizado online aos estudantes dos cursos de gestão hoteleira, ou equivalente, em Portugal, por meio da plataforma LimeSurvey. Das 12 instituições que ofereciam os cursos em estudo, somente 7 aceitaram participar desta investigação. Os respondentes tiveram acesso ao link da pesquisa por intermédio do coordenador do curso da universidade em que estudavam. Inicialmente, os coordenadores foram contatados por telefone e, posteriormente, foi enviado um e-mail com a solicitação para autorização do estudo e aplicação do questionário. Após a aceitação por parte dos coordenadores, foi enviado um novo e-mail com o link do questionário para que fosse disponibilizado para o corpo discente. A coleta de dados ocorreu entre maio de 2016 e setembro de 2016, tendo sido obtidas 112 respostas válidas, sendo, pois, esta amostra por conveniência (Gil, 2002).

A análise descritiva para os 33 itens propostos e a avaliação das diferenças nos atributos pessoais entre diferentes grupos de pesquisados, iniciantes e finalistas, por exemplo, foi realizada com o software IBM SPSS Statistics. Posteriormente, as comparações foram realizadas recorrendo-se aos testes Mann-Whitney U para duas amostras independentes ou Kruskal-Wallis H para amostras independentes, pelo fato de os dados violarem o pressuposto de normalidade associado aos testes paramétricos da amostra, impossibilitando a utilização do teste t e do teste F (Oneway ANOVA). É de se destacar que o recurso aos testes de hipóteses não visa a generalização à população, mas sim auxiliar na avaliação da magnitude das diferenças encontradas. Nessa análise foi considerado o nível de significância de 0,05.

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1. Caracterização da amostra

A amostra foi composta por 112 estudantes, destes a maioria é do sexo feminino (70,5%). As idades estão compreendidas entre 18 e 46 anos, sendo a média 22,6 anos, com dispersão em torno da média, medida pelo desvio-padrão (DP), relativamente baixa (DP=5,20 anos). A metade tem, no máximo, 21 anos. Destaca-se ainda que apenas 8% tem 30 ou mais anos.

Quanto à nacionalidade, a maioria é originalmente portuguesa (82%), seguida dos brasileiros (11%). Relativamente ao local onde vivem, a amostra está distribuída entre oito conselhos, sendo os mais representativos os de Lisboa (33%) e Castelo Branco (24,1%), onde se encontram algumas instituições que participaram do estudo. Tendo em consideração o ciclo de estudo, a maioria frequenta a graduação (89%).  Dos inquiridos que frequentam a graduação, a maior parte está no primeiro ano do curso (41%) e dos que frequentam o mestrado a maioria também se encontra no primeiro ano (75%). No que tange à experiência profissional, somente 22% dos inquiridos já teve alguma experiência curricular no ramo da hotelaria e 21% trabalham atualmente no ramo correspondente, assim como apresentado na Tabela 1.

 

 

 

 

 

 

 

Tabela 1: Descrição da amostra

Amostra

n = 112

Amostra

n = 112

Gênero

Feminino

Masculino

 

71,0%

29,0%

Ciclo de Estudo

Licenciatura

Mestrado

 

89,0%

11,0%

Idade

18 a 21 anos

22 a 25 anos

26 a 29 anos

30 anos ou mais

 

51,8%

33,9%

6,3%

8,0%

Ano do curso de Licenciatura

1º ano

2º ano

3º ano

 

41%

27%

32%

Nacionalidade

Portugal

Brasil

Angola

Cabo Verde

Itália

 

82,0%

11,0%

4,0%

1,0%

2,0%

Ano do curso de Mestrado

1º ano

2º ano

 

 

75%

25%

Conselho de residência

Porto

Lisboa

Leiria

Guarda

Faro

Coimbra

Castelo Branco

Aveiro

 

12,5%

33,9%

9,8%

6,3%

9,8%

2,7%

24,1%

0,9%

Condição atual de trabalho no ramo da hotelaria

Sim

Não

 

 

21%

79%

Experiência no ramo da hotelaria

Sim

Não

 

22%

78%

 

Fonte: Elaborado pelas autoras (2017)

4.2. Análise e discussão dos resultados

A Tabela 2 apresenta as médias e os desvios-padrão dos 33 itens propostos por Dawson et al. (2011) para medir os atributos pessoais dos estudantes por fator, em língua original e a tradução para a língua portuguesa. Nessa tabela, são também apresentados os índices de confiabilidade, Alpha de Cronbach, de cada fator. Esse índice verifica a consistência interna dos itens reflexivos dos fatores. Todos os fatores obtiveram um Alpha maior que 0,60, considerado mínimo aceitável para instrumentos em desenvolvimento (Hair et al., 2010). 

Ao analisar a tabela, é possível perceber que a média das respostas encontram-se compreendidas entre 4,11 (item V33 “possuo um baixo nível de ansiedade”) e 6,20 (item V17 “eu gosto de ajudar os outros”), com dispersão em torno da média baixa para todos os itens.

Em suas pesquisas, Dawson et al. (2011) apontam que uma pessoa com escore igual ou superior a 5,82 teria as características e valores de um profissional que seria bem-sucedido em um ambiente de trabalho que exibe a cultura organizacional da hospitalidade. O escore médio dos estudantes que participaram desse estudo foi de 5,23, um pouco abaixo do esperado para profissionais dessa área.

 

Tabela 2: Estatística descritiva para os 33 itens da escala dos atributos pessoais

 Fatores

 Itens

Alpha de Cronbach

Média[6]

Desvio Padrão

Princípios Média = 5,77

V1

Eu sou muito confiante

I am very trustworthy

0,836

4,79

1,27

V2

Eu sou extremamente honesto

I am extremely honest

5,61

1,19

V3

Eu tenho um elevado grau de integridade

I have a high degree of integrity

5,65

,95

V4

Eu valorizo a transparência

I value truthfulness

6,09

,96

V5

Eu sou conhecido por cumprir minhas promessas

I am nown for keeping promises

5,80

,91

V6

Sou firme nos meus princípios e valores

I stand firm on my beliefs and principles

5,98

1,11

V7

Os outros me descrevem como leal

Others describe me as loyal

5,98

,98

V8

Eu tento liderar dando o exemplo

I try to lead by example

5,73

1,00

V9

Eu faço com que meu superior sinta orgulho

I take pride of ownership

6,03

1,04

V10

Os outros dizem que eu sou confiável

Others say that I am dependable

6,08

,92

Receptividade Média = 5,45

V11

Outros me descrevem como sendo amigável e caloroso Others describe me as friendly and warm

0,858

5,75

1,33

V12

Eu tenho amor pelas pessoas  

I have a love of people

5,61

1,48

V13

Outras pessoas caracterizam-me como alguém alegre  Other people characterize me as cheerful

5,48

1,32

V14

Eu sou conhecido por ser uma pessoa colaborativa

I am known for being a sharing person

5,52

1,31

V15

Tenho uma atitude empática e cuidadosa

I have a caring and empathetic attitude

5,81

,89

V16

Sou uma pessoa culturalmente consciente do outro

I am culturally aware of others

5,72

1,13

V17

Eu gosto de ajudar os outros

I enjoy serving others

6,20

1,02

V18

Eu sou mais social, que gosta de estar em grupo, do que independente / I am more social than independen

5,00

1,54

V19

Eu confio nos outros

I trust others

4,76

1,34

V20

Sou focado no grupo

I am community focused

5,05

1,24

V21

Eu sou uma pessoa muito positiva

I am a very positive person

5,01

1,38

 

 

 

Tabela 2: Estatística descritiva para os 33 itens da escala dos atributos pessoais (continuação)

 Fatores

 Itens

Alpha de Cronbach

Média[7]

Desvio Padrão

Liderança Média = 4,80

V22

As pessoas me percebem como um treinador/orientador Other people considered me to be a coach

0,841

4,68

1,35

V23

Eu sou um líder nato

I am a natural leader

4,36

1,45

V24

Outros consideram que tenho uma forma de pensar estratégica

Others consider me to be strategic in my thinking

4,90

1,43

V25

Eu posso me tornar um líder de destaque em uma organização rentável

I can turn a loss leader into a profitable organization

5,07

1,46

V26

Eu tenho um bom entendimento do negócio

I have a good business sense

5,00

1,24

Assunção de riscos

Média = 5,20

V27

Sou alguém que assumo riscos

I am a risk taker

0,749

5,03

1,20

V28

Sou aventureiro

I am adventurous

5,21

1,14

V29

Assumo riscos calculados

I take calculated risks

5,37

1,10

Objetividade Média = 5,63

V30

Sou muito orientado para o detalhe

I am very detailed oriented

0,601

5,53

1,28

V31

Eu me esforço para ser muito preciso

I strive to be very precise

5,73

1,10

Postura

Média = 4,52

V32

Sou uma pessoa muito calma

I am a very calm person

0,671

4,94

1,47

V33

Possuo um baixo nível de ansiedade

I have a love level of anxiety

4,11

1,63

Fonte: Elaborado pelas autoras (2017)

O fator que apresenta maior média foi o “Princípios” (média=5,77), relacionado a crenças e valores pessoais intrínsecos, como confiança, honestidade, integridade, veracidade, lealdade e confiabilidade, que não necessariamente são desenvolvidos durante o curso. Relativamente aos fatores em que os estudantes obtiveram os menores escores médios, tem-se o fator Liderança (4,8) associado as habilidades pessoais que alguém exibe na gestão dos negócios e de outras pessoas e o fator Postura (4,52) relacionado ao comportamento geral de alguém. Os resultados desses fatores apresentam valores médios significativamente mais baixos, quando comparados com a pesquisa realizada por Dawson et al (2011), onde foram obtidos os seguintes escores médios: fator Liderança (6,00) e fator Postura (5,10).

Acredita-se que esses valores podem ser reflexo da falta de experiência profissional, já que  89% da amostra encontra-se cursando a graduação e destes, 41% estão no primeiro ano do curso. Além da inexperiência, o resultado pode estar também associado ao motivo da escolha do curso pelos estudantes, que ao invés de terem escolhido a profissão por sensibilidade ao setor, podem ter associado a escolha ao bom desempenho do setor do turismo em Portugal, que garante uma abundante oferta no mercado de trabalho.

Procedeu-se então à comparação das médias dos fatores que compõem os atributos pessoais em diferentes grupos de estudantes. Selecionou-se o ciclo de estudo, o ano, a experiência no ramo da hotelaria e o fato de trabalharem ou não  nesse ramo no momento.

Quanto ao ciclo de estudos, utilizando-se o teste Mann-Whitney U, os resultados apontam que, quer estudantes da graduação, quer estudantes do mestrado, tendem a apresentar distribuições do nível de atributos pessoais semelhantes, sendo o escore médio ligeiramente superior nos estudantes de mestrado. No entanto, identificaram-se diferenças significativas (p<0,05) somente nos fatores Princípios e Postura, nos quais os estudantes do mestrado possuem atributos mais adequados do que os estudantes da graduação (Tabela 3).

Tabela 3: Comparação dos escores da escala de atributos pessoais de acordo com o ciclo de estudo

Fatores dos AP

 Ciclo

N

Média

DP

Teste

Princípios

Graduação

100

5,73

0,68

Mann-Whitney U = 387,5; z= -2,003; p= 0,045

Mestrado

12

6,15

0,42

Receptividade

Graduação

100

5,42

0,86

Mann-Whitney U = 550,0; z= -0,471; p= 0,638

Mestrado

12

5,63

0,47

Liderança

Graduação

100

4,76

1,12

Mann-Whitney U = 459,5; z= -1,325; p= 0,185

Mestrado

12

5,12

0,64

Assunção de Riscos

Graduação

100

5,16

0,96

Mann-Whitney U = 445,0; z= -1,467; p= 0,142

Mestrado

12

5,58

0,67

Objetividade

Graduação

100

5,62

1,00

Mann-Whitney U = 548,5; z= -0,492; p= 0,622

Mestrado

12

5,71

1,12

Postura

Graduação

100

4,44

1,36

Mann-Whitney U = 365,5; z= -2,227; p= 0,026

Mestrado

12

5,21

0,96

Nota: N = número de estudantes, DP = desvio-padrão

Fonte: Elaborado pelas autoras (2017)

Quando comparados aos resultados esperados para um profissional da indústria da hospitalidade, segundo os estudos de Dawson et al. (2011), os estudantes do mestrado se mostraram dentro do esperado em dois fatores, quais sejam Postura, em que obtiveram escore médio de 5,21, acima dos 4,94 apresentados no estudo original, e Assunção de risco com escore médio de 5,58, ligeiramente superior aos 5,52 apresentados no estudo original.

Tendo em vista os resultados apresentados, pode-se considerar que a formação pode influenciar significativamente a maneira como o trabalhador irá se comportar, o controle emocional e a capacidade de se manter tranquilo em situações adversas. No entanto, se forem comparados os escores médios totais, pode-se perceber que tanto os estudantes de graduação (5,18), quanto os do mestrado (5,56), apresentam um nível abaixo do esperado (5,82) para um profissional que seria bem-sucedido em um ambiente de trabalho que exibe a cultura organizacional da hospitalidade.

Ao analisar os estudantes de graduação e o ano que frequentam, utilizando-se o teste Kruskal-Wallis H, os resultados apontam para a não existência de diferenças significativas nas distribuições dos escores em todos os fatores (Tabela 4). Destaca-se que nos fatores Princípios, Assunção de riscos e Objetividade, são os estudantes do 3º ano que apresentam um escore ligeiramente superior ao dos seus colegas de anos anteriores. Já nos fatores Receptividade e Liderança estes estudantes apresentam níveis médios ligeiramente inferiores aos dos colegas.

Tabela 4: Comparação dos escores da escala de atributos pessoais dos estudantes
da graduação de acordo com o ciclo de estudo

Fatores dos AP

Ano

N

Média

DP

Teste

Princípios

Ano 1

41

5,55

0,62

Kruscal-Wallis H(2) =3,966; p= 0,138

 Ano 2

27

5,76

0,74

Ano 3

32

5,93

0,65

Receptividade

Ano 1

41

5,44

0,83

Kruscal-Wallis H(2) =0,614; p= 0,736

Ano 2

27

5,47

0,87

Ano 3

32

5,36

0,90

Liderança

Ano 1

41

4,74

0,95

Kruscal-Wallis H(2) =1,666; p= 0,435

Ano 2

27

4,99

1,38

Ano 3

32

4,61

1,10

Assunção de Riscos

Ano 1

41

5,19

0,94

Kruscal-Wallis H(2) =1,439; p= 0,487

Ano 2

27

5,04

1,00

Ano 3

32

5,22

0,96

Objetividade

Ano 1

41

5,49

0,94

Kruscal-Wallis H(2) =2,491; p= 0,487

Ano 2

27

5,52

1,10

Ano 3

32

5,88

0,97

Postura

Ano 1

41

4,17

1,56

Kruscal-Wallis H(2) =4,809; p= 0,090

Ano 2

27

4,98

1,05

Ano 3

32

4,33

1,24

Nota: N = número de estudantes, DP = desvio-padrão.

Fonte: Elaborado pelas autoras (2017)

Estas ligeiras diferenças (não significativas) podem sinalizar que as atividades desenvolvidas ao longo dos anos do curso, as unidades curriculares oferecidas e estágios curriculares planejados não estão contribuindo de forma significativa para desenvolver os conhecimentos, habilidades e atitudes que levem à realização de um trabalho condizente ao esperado e adaptação à cultura organizacional da indústria da hospitalidade. As instituições pesquisadas precisam ter atenção não apenas aos componentes técnicos do curso (como disciplinas voltadas para gestão, línguas, economia, entre outras) mas, sobretudo, devem voltar a atenção para atividades que desenvolvam nos alunos os atributos pessoais favoráveis aos profissionais desta área. É importante salientar ainda que nos fatores Liderança e Postura, os valores médios rondam 4 em todos os anos, revelando que é preciso criar estratégias para desenvolver melhor esses atributos nos estudantes.

Acredita-se que atividades o mais próximo possível da realidade dessa indústria (como estágios curriculares em empreendimentos hoteleiros, onde o estudante possa conviver diariamente com outros profissionais dessa indústria, aprenda a lidar com as necessidades dos clientes, sentir o clima organizacional e assimilar as práticas empresariais) possam auxiliar o desenvolvimento e aprimoramento dos atributos pessoais durante os anos de curso, aumentando assim a empregabilidade dos estudantes e evitando elevados custos de formação e de integração dos novos profissionais e, também, a elevada taxa de rotatividade neste setor.

Em relação à experiência curricular no ramo da hotelaria (Tabela 5), utilizando-se o teste Mann-Whitney U, constatou-se que, tanto os estudantes que tiveram uma experiência curricular, quanto os que não a tiveram, apresentam um razoável nível de atributos pessoais de um profissional que seria bem sucedido na indústria da hospitalidade (valores médios entre 4 e 6). Não há diferenças significativas para nenhum dos fatores.

Tabela 5: Escore dos atributos pessoais de acordo com a experiência curricular no ramo da hotelaria

Fatores dos AP

Experiência

N

Média

DP

Teste

Princípios

Sim

25

5,86

0,61

Mann-Whitney U = 1019,0; z= -0,479; p= 0,632

Não

87

5,75

0,69

Receptividade

Sim

25

5,38

0,81

Mann-Whitney U = 973,5; z= -0,797; p= 0,425

Não

87

5,46

0,83

Liderança

Sim

25

4,87

1,17

Mann-Whitney U = 992,5; z= -0,666; p= 0,506

Não

87

4,78

1,07

Assunção de Riscos

Sim

25

5,15

1,09

Mann-Whitney U = 1077,0; z= -0,074; p= 0,941

Não

87

5,22

0,89

Objetividade

Sim

25

5,42

1,11

Mann-Whitney U = 919,5; z= -1,193; p= 0,233

Não

87

5,69

0,98

Postura

Sim

25

4,40

1,60

Mann-Whitney U = 1005,0; z= -0,582; p= 0,561

Não

87

4,56

1,27

Nota: N = número de estudantes, DP = desvio-padrão.

Fonte: Elaborado pelas autoras (2017)

Tendo em vista o resultado, pode-se concluir que o estágio curricular, da forma como é oferecido pelas instituições de ensino, não representa uma atividade que visa melhorar e/ou desenvolver atributos condizentes com o que é desejado pela indústria da hospitalidade. Mais uma vez, os fatores que apresentaram os valores médios mais baixos foram a Liderança e a Postura, com valores que rondam 4, demonstrando que as instituições precisam investir em criar estratégias para desenvolver melhor esses atributos nos estudantes, já que a experiência curricular no ramo não contribui de forma significativa para o desenvolvimento destes atributos, havendo mesmo, na amostra, alguns fatores em que o escore médio é inferior nos estudantes com experiência (Receptividade, Liderança, Assunção de Riscos e Postura).

Por fim, foi avaliado se o fato de estar trabalhando no momento no ramo da hotelaria faria com que o estudante possuísse atributos pessoais mais adequados à indústria da hospitalidade (Tabela 6). Utilizando-se o teste Mann-Whitney U, constatou-se que, apesar de os estudantes inquiridos que já trabalham na indústria da hospitalidade possuírem uma média mais elevada do que os que não trabalham nessa indústria, as diferenças não são significativas para nenhum dos fatores, o que pode estar sinalizando para o fato de que os estudantes estão trabalhando na indústria da hospitalidade, mais especificamente em hotéis, pela grande oferta de emprego nessa indústria e não por afinidade a ela.

Tabela 6: Escore dos atributos pessoais de acordo com a condição atual de trabalho no ramo da hotelaria

Fatores dos AP

Trabalho

N

Média

DP

Teste

Princípios

Sim

24

5,84

0,63

Mann-Whitney U = 971,0; z= -0,604; p= 0,546

Não

88

5,76

0,68

Receptividade

Sim

24

5,45

0,97

Mann-Whitney U = 1046,5; z= -0,067; p= 0,946

Não

88

5,45

0,79

Liderança

Sim

24

5,07

0,94

Mann-Whitney U = 892,0; z= -1,166; p= 0,244

Não

88

4,73

1,12

Assunção de Riscos

Sim

24

5,25

1,14

Mann-Whitney U = 974,5; z= -0,581; p= 0,561

Não

88

5,19

0,88

Objetividade

Sim

24

5,73

1,05

Mann-Whitney U = 979,5; z= -0,551; p= 0,581

Não

88

5,60

1,00

Postura

Sim

24

4,92

1,79

Mann-Whitney U = 859,5; z= -1,407; p= 0,159

Não

88

4,41

1,18

Nota: N = número de estudantes, DP = desvio-padrão.

Fonte: Elaborado pelas autoras (2017)

5. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Esta investigação teve como objetivo principal avaliar se os estudantes das instituições de ensino portuguesas, voltadas para a hospitalidade e gestão hoteleira, possuem as características e os valores individuais necessários aos profissionais desejados pela indústria da hospitalidade, ou seja, se ao longo dos anos de curso essas instituições são capazes desenvolver nos estudantes os atributos pessoais necessários e desejados aos profissionais dessa indústria.

Por meio de uma análise quantitativa, utilizando-se um instrumento criado por Dawson et al. (2011), procurou-se identificar os atributos individuais apresentados pelos estudantes e verificar se esses atributos estão alinhados com os atributos de uma pessoa que seria bem-sucedida em um ambiente de trabalho que exibe a cultura da hospitalidade.

No que concerne aos atributos individuais dos estudantes, os resultados apontam que tanto os estudantes de graduação quanto os do mestrado têm um razoável nível de atributos pessoais de um indivíduo que seria bem-sucedido na indústria da hospitalidade, sendo que os estudantes que frequentam o mestrado apresentaram um resultado ligeiramente melhor. No entanto, o escore médio dos inquiridos foi um pouco abaixo (5,23) do esperado para estudantes dessa área (5,82). Os fatores Princípios e Postura foram os que apresentaram maior diferença quando feita uma comparação entre os estudantes da graduação e do mestrado.

Adicionalmente, percebeu-se que os três anos de graduação oferecidos pelas instituições de ensino portuguesas não são suficientes para o desenvolvimento dos atributos pessoais, uma vez que os estudantes do terceiro ano não obtiveram um escore médio significativamente melhor do que os do primeiro ano, ou seja, praticamente não houve melhoria ao longo dos anos de estudo. No que tange à experiência profissional, poucos tiveram experiência curricular no ramo da hotelaria, ou atualmente trabalham no ramo, e o fato de já haver sido realizado um estágio curricular na área não teve impacto positivo no desenvolvimento dos atributos pessoais desejados.

Os resultados obtidos apontam para a conclusão de que a formação que os estudantes vêm recebendo não contribui de forma significativa para a formação de atributos pessoais favoráveis à indústria da hospitalidade. As instituições de ensino portuguesas, principalmente ao nível da graduação, precisam criar estratégias capazes de fazer com que os estudantes desenvolvam os atributos necessários ao trabalho nessa indústria. Assim, ao entrarem para o mercado de trabalho, estes novos profissionais não se sentirão frustrados, por não conseguirem se adaptar ao ambiente e, possivelmente, não deixarão o emprego, aumentando um problema já existente nessa indústria, que é a alta rotatividade (Baltieri, 2011; Dawson et al., 2011; Lamonato & Presser, 2015).

Acredita-se que este estudo possa ter contribuído não somente para que se conheça a realidade portuguesa no que tange ao desenvolvimento pelos estudantes dos atributos pessoais necessários para o sucesso na indústria da hospitalidade, como também para alertar as instituições de ensino sobre como os programas de formação oferecidos estão preparando os estudantes para se tornarem parte da indústria em que se propuseram a trabalhar.

Além disso, o instrumento que foi traduzido no presente estudo pode ser utilizado para replicar a análise realizada em diferentes países de língua portuguesa. Pode também ser utilizado por gestores da área de RH nos processos de: 1. seleção de candidatos para a indústria, uma vez que é possível diagnosticar se o profissional tem potencial para desenvolver as características e valores desejados por essa indústria (Tepeci et al., 2002; Dawson et al., 2011); 2. avaliação dos profissionais que já atuam na organização no intuito de identificar os atributos que se encontram menos favorecidos e traçar planos para desenvolvê-los. 

Quanto às limitações deste estudo, considera-se a coleta de dados e, consequentemente, a representatividade da amostra uma questão que necessita ser melhor trabalhada em estudos posteriores, pois nem todos os estudantes responderam ao questionário enviado eletronicamente e algumas instituições de ensino superior optaram por não participar da investigação. Assim, os resultados não podem ser generalizados a todos os estudantes das instituições de ensino superior que frequentam o curso de gestão hoteleira ou equivalente em Portugal. No entanto, considera-se que o estudo é um bom indicador para análises posteriores.

Por fim, para futuras pesquisas, sugere-se a realização de um estudo comparativo entre os cursos da indústria da hospitalidade e outros cursos para verificar se os estudantes da hotelaria apresentam escores diferentes dos seus colegas de outras áreas científicas. Também seria interessante realizar um estudo que relacione os atributos pessoais dos estudantes às suas percepções quanto às características da profissão e ao seu interesse, permitindo avaliar de que forma a imagem que se tem da profissão pode estar influenciando a escolha dos estudantes pela profissão.

 

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Artigo recebido em: 08/05/2018

Avaliado em: 13/05/2018

Aprovado em: 14/05/2018

 



[1] Aluna de doutoramento no ISCTE-IUL. Tem um Mestrado em Gestão e é investigadora no Information Sciences and Technologies and Architecture Research Center (ISTAR-IUL) do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), Lisboa, Portugal. Instituição/Afiliação: Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7025-9470 E-mail: adriana.fernandes@iscte.pt

[2] Graduada em psicologia (2013) pela Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública e tem um mestrado em Gestão de Recursos Humanos pelo Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), Lisboa, Portugal. Instituição/Afiliação: Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL). E-mail: drielle86@gmail.com

[3] Graduada em Direito (1999) pela UFMG e em Administração com habilitação em Comércio Exterior (1997) pela UNA/MG, com especialização em Administração de Recursos Humanos (1999) e Mestrado em Relações Internacionais (2002) pela Ohio University (EUA). Instituição/Afiliação: FUNCESI (Fundação Comunitária de Ensino Superior de Itabira) – MG. E-mail: lilianponzo@yahoo.com

[4] EMEA (Europe, the Middle East and Africa) é uma designação geográfica usada principalmente pelas empresas para descrever seus negócios nessas regiões (Pera, 2016).

[5] Por empreendimentos turísticos serão considerados hotéis e pousadas (Deloitte, 2016).

[6] Nota: (1) Escala de (1) “discordo totalmente” a (7) “concordo totalmente”.

[7] Nota: (1) Escala de (1) “discordo totalmente” a (7) “concordo totalmente”.